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Síntese da Conjuntura - Desequilíbrio Fiscal

Ex-ministro Ernane Galvêas analisa atual cenário econômico

Jornal do BrasilErnane Galvêas
O Governo enviou ao Congresso Nacional o Orçamento da União 2016 desequilibrado, com um déficit de R$30,5 bilhões, possivelmente com a intenção de mostrar ao setor político a gravidade da situação fiscal. Não foram incluídos no Orçamento alguns gastos que podem elevar o déficit a mais de R$70 bilhões, segundo o Relator Deputado Ricardo Barros. No quadro da Receita, estão incluídos R$37,3 bilhões, provenientes da expectativa da venda de ativos (R$27,3 bilhões) e de concessões (R$10,0 bilhões). 
Ademais, estima-se um acréscimo da arrecadação de R$11,2 bilhões, pelo aumento da tributação em 2016, sobre aparelhos eletrônicos, bebidas quentes, direito de imagem e IOF sobre as operações de crédito do BNDES. Além disso, segundo o IBPT, a proposta de unificar a base tributária do PIS/COFINS, elevando as alíquotas sobre o faturamento bruto, poderá aumentar a arrecadação em R$50 bilhões. A Receita Federal divulgou Nota para contestar as estimativas do IBPT. Acrescente-se a tudo isso o montante dos juros sobre a dívida pública, estimado em R$450 bilhões.
Na área municipal, estuda-se a elevação do imposto sobre doações e heranças, que passaria dos níveis atuais entre 4% e 8% para 20%. Uma tragédia.
Como é fácil perceber, todas essas propostas levam a NADA, inclusive a aceitação de um superávit primário de 0,7%, como quer Joaquim Levy. Os juros sobre a dívida pública chegam a cerca de 8,0% ao ano, dez vezes mais que o superávit pedido pelo Ministro da Fazenda. Assim sendo, inevitavelmente, a relação dívida pública/PIB vai caminhar para insuportáveis 70%, em 2016. Embora mínimo, a proposta de um superávit primário de 0,7% é, hoje, o fiador do Governo, para impedir a perda do grau de investimento. Só não entende isso quem deseja a saída do Ministro Levy.
Foi principalmente com base nesses registros que a Agência Standard & Poor's retirou o selo de bom pagador e o grau de investimento do Brasil. Uma decisão injusta, precipitada e incompetente. Embora ostentando um crescente endividamento, o Brasil nunca deixou de pagar suas dívidas nos últimos dez anos.
PREVIDÊNCIA SOCIAL
O Governo, ao que tudo indica, está ciente da "bomba relógio" que é o Sistema Geral da Previdência Social, face à reversão do bônus demográfico, ou seja, da redução do número de pessoas trabalhando e do aumento do número de idosos aposentados. A falta de um dispositivo elevando a idade para aposentadoria, decidiu-se pelo artifício do "fator previdenciário", que incluiu nos cálculos da aposentadoria os anos correspondentes à expectativa de vida. Foi a única medida inteligente, em todo o contexto da previdência social. Mas durou pouco, como se vê das propostas irresponsáveis de sua substituição pela fórmula 85/95.
Em oportunidade anterior, o próprio Governo já havia cometido o equívoco de subtrair do INSS o pagamento de 20% da contribuição social das empresas sobre a folha de pagamentos, mediante sua transferência para o faturamento, contemplando um
certo número de setores, com a ilusão de que estaria incentivando a criação de empregos. Uma medida que, rigorosamente, poderia ser taxada como "um erro grosseiro". Aí, veio a pseudo correção, aumentando em 150% as alíquotas sobre o faturamento. Um duplo erro grosseiro, que provocou fortes reações do empresariado privado, aumentando o clima de desconfiança. "Pior a emenda que o soneto".
Duas medidas constantes da proposta de ajuste fiscal podem ser consideradas positivas, porém de reduzido efeito: a elevação da idade dos beneficiários de pensão com idade inferior a 40 anos e a ampliação dos prazos relativos ao seguro-desemprego.
CONTROLE DA INFLAÇÃO
Segundo a teoria clássica, a elevação da taxa de juros seria o mais eficiente instrumento para restringir uma alta de preços (inflação) motivada por um excesso de demanda agregada (consumo + investimentos). A eficácia da elevação da taxa de juros opera através da oferta de crédito, produzindo uma redução da atividade econômica e a consequente redução das pressões sobre os preços.
Em uma conjuntura inflacionária, é óbvio que a redução das atividades econômicas pode ser o caminho adequado para refrear a alta dos preços. A questão que se põe, entretanto, é até onde deve ser levada a recessão econômica para gerar o necessário controle da inflação, pois não tem cabimento um "tratamento de choque que cura a doença pela morte do paciente". O controle da inflação é a atividade meio, para chegar à atividade fim, que é o crescimento econômico.
Essas considerações são válidas para avaliar a atual obsessão do Banco Central em praticar a mais alta taxa real de juros do mundo. Estranhamente, há muitos economistas que defendem a mesma tese.
Neste ano de 2015, a produção industrial deve cair 6,0% e o volume de vendas do comércio -6,5%, enquanto o desemprego caminha para mais de 8%, atingindo 18,6% para a população de trabalhadores com idade entre 18 e 24 anos. Nesse segmento mais jovem, no Nordeste, a queda é de 22,0%. Ainda assim, há uma inflação inercial que teima em manter-se entre 7% e 9%, impulsionada basicamente pela política salarial, pelo elevado déficit fiscal e pela inexplicável elevação dos custos da produção provocada pela burocracia oficial.
Nesse contexto, questiona-se a validade da elevada taxa de juros praticada pelo Banco Central. E tudo indica que a política monetária caminha na direção errada, na contramão dos objetivos da política econômica. Observe-se que a redução da oferta de crédito pelo BNDES e Caixa Econômica nada tem a ver com a política monetária do Banco Central.
SETOR PÚBLICO
As atenções do Governo estão concentradas no objetivo de zerar o Orçamento da União, e buscar o apoio do Congresso para cobrir o déficit de R$30,5 bilhões. Há, no Governo, um grupo que propõe o corte das despesas com alguns reajustes de tributos, e outro grupo contrário, que defende a continuada expansão dos gastos e forte aumento da carga tributária.
O segundo grupo está levando vantagem e não compreendeu, ainda, a maldição da Lei de Laffer, segundo a qual a carga tributária acima do limite de um terço do PIB (33%) funciona como freio de contração da arrecadação. Além de equilibrar o orçamento corrente, o Governo tem que produzir um colossal superávit primário para cobrir a carga dos juros (R$450 bilhões) que pesa sobre a dívida pública e impedir a explosão da relação dívida/PIB. Na conjuntura atual, falta entrosamento nesse sentido, entre o Planalto e o Congresso, e também entre os principais Ministros e o Banco Central.
ATIVIDADES ECONÔMICAS
O declínio da atividade atinge todos os setores da economia, liderados pela forte queda na indústria de transformação (-8,5%) e na construção civil (-2,4%), assim como no setor serviços (-1,6%), com reflexos na taxa de desemprego (-8,3%) e na arrecadação tributária real (-3,6%). A produção de embalagens recuou 2,6%. As vendas de materiais de construção caíram 10,9% em agosto. O PIB nacional caiu 1,9% no 2º trimestre, entre abril e junho, e menos 2,6% no acumulado do ano até junho. A previsão do mercado é de queda de 2,26% em 2015 e de -0,4% em 2016. O total de investimentos caiu 9,8%.
O número de novas empresas chegou a 990,9 mil no 1º semestre (+4,9%), sendo 748,4 mil de microempreendedores individuais (MEI), basicamente devido às facilidades de formalização legal (Serasa). Entre janeiro e julho, o consumo de energia elétrica teve redução de 1,4%, com queda de 4% na indústria e 0,5% nas residências. A perspectiva de crise hídrica ainda não desapareceu; o Sistema Cantareira, à beira de um colapso, registrou em agosto o segundo índice mais sério, em 85 anos (SABESP). Os pedidos de recuperação judicial aumentaram 41,6% de janeiro a agosto (Serasa).
Indústria
A produção industrial recuou 1,5% em julho sobre junho, puxados pela queda de 6,2% na produção de alimentos, basicamente devido a alta taxa de desemprego, redução da renda e inflação.
O setor industrial encolheu 4,3% no 2º trimestre contra o primeiro, pior momento desde 2009. No período de 12 meses, até julho, a queda foi de 5,3%, com destaque para a produção de bens de capital, com queda de 16,8% (!?). Também caíram fortemente os bens de consumo (-6,2%) e bens intermediários (-3,2%). A indústria está produzindo 14,5% menos do que em 2013 (IBGE). A indústria automobilística registrou queda de 16,9% no acumulado de oito meses até agosto.
As vendas de automóveis caíram 8,9% em agosto frente a julho, 22,9% em relação a agosto/14. A produção de petróleo em julho alcançou 2.466 milhões b/d, 8,8% acima de julho/14. No 1º semestre, a produção da indústria têxtil, em São Paulo, caiu 9,7%.
Segundo a CNI, o índice de capacidade utilizada ficou em 78,6% em julho, o menor patamar desde 2003.
Comércio
O consumo das famílias caiu 2,1% no 2º trimestre sobre o primeiro, indicando a redução nas vendas do comércio varejista (CNC). Segundo a SERASA, o movimento dos consumidores nas lojas caiu 1,1% em agosto sobre julho e -0,7% em relação a agosto/14, mas ainda acumulou em oito meses do ano alta de 1,9%.
O setor de serviços encolheu pela 1ª vez desde 1990 e projeta queda de 1,5% em 2015 (IBGE).
O índice de confiança dos empresários do comércio caiu 0,9% de julho para agosto, recorde histórico negativo (CNC). O percentual de famílias com dívidas subiu de 61,9% em julho para 62,7% em agosto (CNC).
Agricultura
A produção agrícola no Centro-Oeste deverá receber chuvas regulares durante a primavera, até dezembro. O mesmo se espera no Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A grande interrogação do momento é a intensidade esperada do El Niño, que poderá prejudicar o Centro-Oeste, mas beneficiará a Região Sul.
Segundo a USDA, a colheita brasileira de soja na safra 2015/16 deverá aumentar 0,08% e a de milho cair 6%.
As exportações de soja, até agosto, aumentaram 11,4% em toneladas, mas caíram 6,1% em valor. Em agosto, as exportações de milho tiveram perda de 7,1% em volume e de 18% em valor, em relação a agosto/14.
Mercado de Trabalho
A taxa de desemprego subiu de 7,9% para 8,3% entre o 1º e o 2º semestre, comparado com 6,8% no 2º trimestre de 2014. A população ocupada - 92,2 milhões - permaneceu estável, assim como o rendimento médio real dos trabalhadores. 78,1% possuem carteira de trabalho.
Setor Financeiro
Em agosto, os saques nas cadernetas de poupança somaram R$7,5 bilhões, acumulando queda de R$48,5 bilhões no ano. É o pior resultado em 20 anos. No 1º semestre, o BNDES liberou R$68,8 bilhões em empréstimos, 18% abaixo de igual período em 2014. Consultas para novos projetos caíram à metade, sendo -16% da indústria, 57% da infraestrutura e 65% do comércio. A alíquota do IOF subiu 1,5% nos empréstimos do BNDES.
A VALE captou R$1,35 bilhão em debêntures, para investimentos em infraestrutura, com isenção de imposto de renda para pessoas físicas e estrangeiros.
Inflação
O Banco Central manteve a taxa SELIC em 14,25%. A inflação está em queda, puxada pela baixa nos preços dos alimentos in natura, influenciada pela boa safra, assim como da recessão, do desemprego e da queda dos rendimentos do trabalho. O Banco Central acredita que é efeito da elevação da taxa SELIC (!?). O IGP-DI/FGV desacelerou de 0,58% em julho para 0,40% em agosto, com destaque para tomate, batata e cebola. O IGP-M/FGV caiu para 0,28% e o índice de preços ao consumidor (IPC) ficou em 0,22%.
O preço da cesta do DIEESE, em agosto, caiu em 15 de 18 capitais: Fortaleza (-4,6%), Salvador (-4,02%), Brasília (-3,46%) e Rio de Janeiro (-2,77%). Entretanto, no acumulado dos oito meses, houve alta generalizada. O IPC/FIPE deverá cair de 1,51% em agosto para 0,32% em setembro. E a Petrobras anuncia reajuste de 15% no gás de botijão.
O Governo adiou para 2017 a meta da inflação de 4,5% e o Orçamento enviado ao Congresso prevê inflação de 5,4% em 2016.
Setor Público
O Governo já perdeu a luta para promover algum equilíbrio na situação fiscal em 2015 e já se prepara para perder também em 2016. Ainda não percebeu o equívoco que representa aumentar a carga tributária para aumentar a arrecadação (Lei de Laffer).
No corrente ano, na melhor das hipóteses, prevê-se um déficit nominal de 7% do PIB. A estimativa para o próximo ano é de uma Receita de R$1.180 bilhão contra Despesa de R$1.210,6 bilhão, com déficit de R$30,5 bilhões, que poderá chegar a R$70 bilhões (!). Para cobrir esse déficit, o Governo estaria programando a venda de ativos e novas concessões, no montante de R$37,5 bilhões. O orçamento 2016 prevê um aumento de Despesas de R$104,8 bilhões.
Segue a tragédia do déficit da Previdência Social: 2014 R$56,7 bilhões, 2015 R$88,9 bilhões e 2016 R$124,9 bilhões.
Setor Externo
A Balança Comercial de agosto teve um resultado positivo ilusório de +US$2,689 bilhões, com exportações de US$15,485 bilhões e importações de US$12,796 bilhões. Por que ilusório? Porque no acumulado do ano, as exportações caíram 16,7% e as importações 21,3%. Essa queda vem ocorrendo desde 2012. Há uma grande expectativa sobre o volume de recursos externos que poderá ingressar no País, após a aprovação da Lei de Anistia.
No cenário internacional, a economia dos Estados Unidos cresce 2,4%, com aumento de emprego. Na Europa, a Zona do Euro cresce 1,4% e a Inglaterra +2,5%. A China continua crescendo em torno de 7,0%.
O grande destaque na Europa, no momento, é a imigração dos refugiados do Oriente Médio. Chega a quase 2 milhões o número de pedidos de asilo. Segundo a ONU, 360 mil pessoas já chegaram à Europa neste ano.
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Autor Everaldo Paixão

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