Aproveitando-se da proximidade do Mundial, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto torna-se o principal protagonista das manifestações, bloqueia avenidas de São Paulo e promete "Copa de sangue" se não tiver reivindicações atendidas
O rol de preocupações do governo federal com a miríade de grupos dispostos a usar a Copa do Mundo para transformar em realidade as mais variadas demandas sociais e trabalhistas ganhou um protagonista de peso na quinta-feira 22. Com mais de 20 mil pessoas a travar as principais avenidas de São Paulo em uma noite chuvosa, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) deu uma demonstração de força e de mobilização popular rara. Ao contrário das manifestações de junho, que levaram milhões de pessoas às ruas há um ano, o MTST tem uma pauta clara e definida – moradia para as populações de baixa renda – e um controle absoluto sobre seus integrantes. Demandas difusas e ausência de liderança, marcas registradas da onda de protestos que tomou conta do País nos últimos 12 meses, não fazem parte do cardápio do movimento dos sem-teto. O que pode ser bom e ao mesmo tempo ruim para o governo, às vésperas da Copa do Mundo.
VAI TER MORADIA OU COPA?
Na chuvosa noite da quinta-feira 22, o MTST levou mais de 20 mil pessoas
às ruas de São Paulo. Ao contrário das manifestações de
junho de 2013, o movimento tem pauta bem definida
O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto vem promovendo manifestações com frequência em São Paulo. Nas últimas semanas, milhares de integrantes do MTST fecharam ruas e avenidas da cidade. Mas nada se compara ao ato promovido pelos sem-teto na noite da quinta-feira 22. Além do número de pessoas, a direção dos sem teto demonstrou um grande poder de organização e um controle absoluto sobre os integrantes do movimento. Ao comando dos coordenadores, os manifestantes liberavam calçadas para os pedestres, fechavam ruas ou simplesmente trancavam a passagem para quem quisesse ir e vir. O ato, que começou no largo da Batata, zona oeste de São Paulo, passou pelas avenidas Faria Lima, uma das mais importantes da cidade, e Cidade Jardim e terminou na ponte Estaiada. A manifestação tinha o apoio do Comitê Popular da Copa, que, na semana passada, reuniu 1.500 pessoas num ato que acabou em confronto entre manifestantes e PMs. Há duas semanas, o MTST já havia invadido sedes de empresas que construíram estádios que receberão jogos da Copa. “Os empresários e a Fifa tiveram seu pedaço do bolo. O trabalhador agora quer sua fatia”, afirmou Boulos.
Após meses de manifestações que não conseguiram mobilizar a população contra a Copa do Mundo, o MTST chega às vésperas do Mundial como candidato a ser o principal protagonista na disputa que será travada fora dos gramados. Para o governo, a notícia boa é que há com quem dialogar e negociar. A ruim é que os sem-teto parecem ter uma visão muito mais pragmática do que ideológica a respeito do que representa o Mundial e seu sucesso para o governo de Dilma Rousseff ou, em âmbito estadual, para Geraldo Alckmin (PSDB) e Fernando Haddad (PT) na cidade de São Paulo. Entre as reivindicações das dezenas de milhares de homens, mulheres e crianças que pararam São Paulo na noite da quinta-feira 22 está a reforma urbana, com foco em moradia, emprego, saúde e educação.
ELE COMANDA
Líder do MTST, Guilherme Boulos: um jovem de classe
média alta formado em filosofia pela USP
“Se tentarem nos tirar à força, teremos uma Copa de sangue”
Guilherme Boulos, líder do MTST
Apesar de faltar menos de um mês para o
início da Copa, ainda é cedo para saber se Boulos e os sem-teto
cumprirão as ameaças. Por enquanto, o movimento se aproveita da
proximidade do início do Mundial para pressionar os governos a
estabelecer compromissos. Mas, em um momento de inflação alta, contas
públicas desequilibradas e eleições à vista, promessas vagas podem
servir apenas como a fagulha necessária para eclodir o incêndio.
Combustível, há de sobra.Guilherme Boulos, líder do MTST
Gangsterismo sindical
Em meio à investigação sobre as greves, surge um personagem que constrange o prefeito Fernando Haddad: o petista Luiz Moura, aliado do secretário de Transportes
FOLHA CORRIDA
O deputado Luiz Moura, ligado ao secretário de Haddad, participou
de reunião em que membros do PCC planejavam ações criminosas
Em meio ao caos instalado na cidade, a atuação da Polícia Militar durante os protestos, classificada de “omissa” pelo secretário de Transportes da cidade, Jilmar Tatto (PT), ao não garantir, de acordo com ele, “o direito de ir e vir da população”, deflagrou uma troca de acusações entre os governos estadual e municipal e trouxe à tona um personagem conhecido no PT: o deputado estadual petista Luiz Moura. Não bastasse a inoperância do prefeito Fernando Haddad, que, na última semana, além de ter sido surpreendido pela greve, assistiu impassível à ação dos manifestantes, o surgimento de Moura o deixou numa situação constrangedora, para dizer o mínimo.
Aliado de Jilmar Tatto, secretário de Haddad, Moura é dono de quatro linhas de peruas e participou de um encontro, no dia 17 de março, ápice dos incêndios a ônibus em São Paulo, na sede da Cooperativa Transcooper, em Itaquera, na zona leste, em que membros do PCC planejavam as ações criminosas. A Transcooper tem permissão da prefeitura para explorar linhas de ônibus em três áreas da cidade. No encontro, monitorado pela Polícia Civil, estariam, em tese, sendo discutidos temas de interesse dos cooperados. Porém, segundo a investigação, 11 desses suspeitos de ligação com o PCC não participam formalmente de atividades do setor. De acordo com o boletim de ocorrência da ação, cerca de 40 pessoas se reuniam para “ajustar condutas teoricamente infracionais”. De acordo com o subsecretário estadual de Comunicação, Márcio Aith, o motivo não era “nada republicano”. Além do petista Luiz Moura, entre os participantes havia um homem procurado pela Justiça: Carlos Roberto Maia, conhecido como Carlinhos Alfaiate, acusado de participar do furto do Banco Central, no Ceará, em 2005, quando foram levados R$ 164,8 milhões.
Foto: ALEX SILVA/ESTADÃO CONTEÚDO, Fernando Neves/Futura Press/Folhapress; Marlene Bergamo/Folhapress; Apu Gomes/Folhapress; Luiz Carlos Marauskas/Folhapress
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