Paulo Cesar de Araújo, autor censurado de 'Roberto Carlos em Detalhes', admira-se com a postura de Chico Buarque, desmente o compositor e afirma que a tese do Procure Saber é cópia da ação judicial contra sua obra
Cecília Ritto, do Rio de Janeiro
Chico Buarque dá entrevista a Paulo César Araújo
(Arquivo Pessoal)
"Pois é. Sou processado pelo Roberto Carlos e, agora, vem o
Chico Buarque contra mim. Não é fácil. São duas instituições nacionais"
Nesta quarta-feira, o Buarque filho, ao defender seu ponto de vista em um artigo na capa do Segundo Caderno do jornal O Globo, foi um pouco mais fundo, e acusou Araújo de mentir. O biógrafo de Roberto – que também tem lá sua admiração por Chico – se magoou, mas contra-atacou: em entrevista ao site de VEJA, ele assegura que entrevistou o compositor, e, como revelou o Radar On-Line, há registros do encontro, inclusive imagens. A entrevista com Chico aconteceu, segundo ele, na tarde de 30 de março de 1992. Na época ainda casado com a atriz Marieta Severo, na Gávea. Por quatro horas, a conversa foi gravada em fitas VHS, que, esta tarde, foram enviadas para conversão em formato DVD. Uma equipe da PUC-Rio acompanhou Araújo, então um aluno do curso de Jornalismo. "Pois é. Sou processado pelo Roberto Carlos e, agora, vem o Chico Buarque contra mim. Não é fácil. São duas instituições nacionais", disse, esta tarde.
Uma biografia futura de Chico há de trazer a história completa, bem como a posição do compositor em relação à obra de Araújo. “Pensei que o Roberto Carlos tivesse o direito de preservar sua vida pessoal. Parece que não”, escreveu Chico n’O Globo.
Escrever biografias, como têm demonstrado os autores, não é exatamente uma forma de ficar rico. E dá muito trabalho. Nos 15 anos de pesquisa sobre Roberto Carlos, Araújo amealhou farto material, a ponto de produzir também o livro Eu Não Sou Cachorro Não, sobre a música brega. Pela conta do autor foram 175 entrevistas com personagens da música brasileira - de João Gilberto a Waldick Soriano; milhares de audições de registros de todo tipo, entre discos e gravações de programas de rádio; consultas a arquivos de televisão, jornais e revistas; viagens aos rincões do país atrás de arquivos pessoais de fãs. E conseguiu algo dificílimo até para os jornalistas mais experientes do mercado: entrevistou Chico Buarque.
Os advogados do cantor utilizaram-se dos agora famosos artigos 20 e 21. O artigo 20 diz que a divulgação de escritos sobre uma pessoa pode ser proibida se atingir a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se for destinada a fins comerciais. Esse foi o principal argumento de Roberto Carlos. “O Roberto entrou com uma ação civil e outra criminal contra mim. Em uma frente ele pediu indenização e, em outra, a minha prisão por no mínimo dois anos. Ele pediu cadeia a um escritor de livros no Brasil”, diz Araújo, desde então, justificadamente ressentido com a ameaça vinda de quem mais admira.
Em 2012, a Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel) impetrou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando os dois artigos. Diante da possibilidade de verem suas vidas contadas em livros sem autorização prévia, os integrantes do Procure Saber, como Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil, Djavan e, claro, Roberto Carlos, tomaram para si os argumentos que constam naquele processo.
Araújo leu e releu tudo de trás para frente. E afirma que o Procure Saber deve bastante aos advogados de Roberto. “O Procure Saber não inventou nada. Quando li os argumentos deles, pensei: ‘Já li isso em algum lugar’. Aí voltei ao processo e vi que estava tudo lá”, conta Araújo. A teoria de Djavan de que “editores e biógrafos ganham fortunas enquanto aos biografados resta o ônus do sofrimento e da indignação”, como escreveu em O Globo, foi um dos aspectos levantados por Roberto Carlos contra Araújo. “Mesmo que desse dinheiro fazer biografia no Brasil, isso é imoral e indigno. Primeiro, o Procure Saber disse que se tratava de uma questão de privacidade. Depois, que era um problema financeiro. Isso enfraquece ambas as reivindicações. Um biógrafo trabalha com temas. O meu foi Roberto Carlos. O dele já foi Jesus Cristo, por exemplo. O trabalho é meu, o esforço é meu. Ele foi apenas o meu tema e não tem direito sobre isso”, argumenta Araújo.
Os dois grupos – o Procure Saber e o de quem não tem nada a esconder – se preparam para uma audiência pública convocada pela ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, sobre a questão das biografias. Araújo estará lá, para, como faz há pelo menos seis anos, defender que as histórias de vida de pessoas públicas possam ser publicadas sem necessidade do consentimento do biografado. “O Roberto Carlos alegou que a história era um patrimônio dele e que eu me apropriei disso. Ou seja, ele me acusou de roubo. E, por isso, pediu a minha prisão. Se a história é uma propriedade particular, é porque consideram a história como um automóvel. Triste ver o filho do autor de Raízes do Brasil encampar isso”, diz, ainda sobre Chico.
Enquanto o lugar da biografia não autorizada de Roberto Carlos é na ilegalidade, Paulo Cesar Araújo continua a atualizar o banco de dados sobre o cantor. Se o STF aprovar a publicação, o livro voltará ao mercado. O sucesso de Esse Cara Sou Eu será incluído. E a faceta autoritária de Roberto Carlos também estará lá. “Em detalhes”, promete.
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